A NUVEM DE CALÇAS
(fragmentos)
(...)
Ternos amantes!
Vós competis com o violino
e com timbales competem os boçais.
Mas como eu não podeis fazer?
Ser todo lábios, sem pesado corpo?
Das vossas salas de fausto,
do clube angelical membros preclaros,
vinde escutar, vinde saber.
Vinde, vós, que lábios folheais
como a cozinheira um livro de receitas.
Se quiserem,
serei apenas carne louca
e, como o céu, mudarei de tom,
se quiserem,
serei impecavelmente delicado,
não serei homem, mas uma nuvem de calças!
Não acredito que haja uma Nice florida!
Hoje de novo canto a glória
dos homens que o pecado fez malignos
e das mulheres gastas como um lugar-comum.
(...)
Que me importa Fausto,
deslizando com Mefistófeles
em foguetões feéricos no solho célico encerado!
Eu sei
que um prego no meu sapato
é mais terrível que a imaginação de Goethe!
Eu,
o de lábios dourados,
cujas palavras
renovam o espírito
e festejam o corpo,
vos digo:
a mais insignificante partícula de vida
tem mais valor que tudo o que escrevi.
Maiakóvski em tradução de Manuel de Seabra
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