quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

George Seeley, 1910


É sempre o mesmo fingimento, o igual cadáver adiado, a sempre mente dispersa. Aqui estou, ressuscitado, Eu – Schopenhauer – e, num dos quartos do Paraíso onde respiro, acho um consolo na cannabis que acendi.

A piscina mostra seu abismo azul-claro, – um abismo, um belo abismo.

Nela mergulho mágoas, vísceras grudentas. Sem a vertigem eu seria um corvo a crocitar em ramagens e adágios. Hilda Hilst, quem diria, mora no quarto contíguo ao meu e me leva a toda parte --- dormimos naquele banco do jardim ---, encharcados d’água desse chafariz fingido; sim, fingido, posto que aqui no Paraíso não há nada, apenas a mente quântica existe aqui e, agora, a tudo inventa, sem nuvens e ressentimentos. Pois este “agora” é o motivo particular e a sina. Se eu nunca mais morrer, como presumo, sobreviverei no nome desse ventilador que esparze folhas de calêndulas pelas peles cântaras. Sonhas, não? Hilda Hilst faz um gesto negativo.

– Agora, aqui no Paraíso, é que não sonho mais, meu querido. De manhã, é o próprio Deus que me acorda e o Pegasus trepa comigo na cama de chuva onde trocamos carícias e fumamos a luz invencível.

Para sempre ressuscitado, Eu – Schopenhauer – aprendi que o sol é a sombra do sol e me recuso a molhar os gatos durante a chuva. Tenho outro ar agora: os olhos metidos para dentro vêem pensar o cérebro.