sexta-feira, 19 de junho de 2009

Duane Monczewski, 1992

É sempre o mesmo fingimento, o igual cadáver adiado, a sempre mente dispersa. Aqui estou, ressuscitado, Eu – Schopenhauer – e, num dos quartos do Paraíso onde respiro, acho um consolo na cannabis que acendi.

A piscina mostra seu abismo azul-claro, – um abismo, um belo abismo: nele mergulho mágoas, vísceras grudentas.

Sem a vertigem eu seria um corvo a crocitar em ramagens. Hilda Hilst, quem diria, mora no quarto contíguo ao meu e me leva a toda parte, dormimos naquele banco do jardim, encharcados d’água desse chafariz fingido; sim, fingido, posto que aqui no Paraíso não há nada, apenas a mente quântica existe aqui e, agora, a tudo inventa, sem nuvens e ressentimentos. Pois este "agora" é o motivo particular e a sina.

Se eu nunca mais morrer, como presumo, sobreviverei no nome desse ventilador que esparze folhas de calêndulas pelas peles cântaras. Sonhas, não? Hilda Hilst faz um gesto negativo:

– Agora, aqui no Paraíso, é que não sonho mais, meu querido. De manhã, é o próprio Deus que me acorda e o Pegasus trepa comigo na cama de chuva, onde trocamos carícias e fumamos a luz invencível.

Para sempre ressuscitado, Eu – Schopenhauer – aprendi que o sol é a sombra do sol e me recuso a molhar os gatos durante a chuva. Tenho outro ar agora: os olhos metidos para dentro vêem pensar o cérebro. Recito um poema para o Deus:

O SOL ESCURO

O homem do calabouço passeia sob o sol escuro:

– Se o sol é a sombra de Buddha,
quem é Buddha, então?

Buddha vaticina:
– Hoje mesmo os teus olhos iluminarão o sol.

O homem do calabouço argumenta:
– Altamente concentrado no unilateral,
jamais serei claro.

Buddha diz ao homem do calabouço:
– Em você é real e claro o que é invisível,
falante de uma fala que é da gramática só uma lasca.