quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Antoinette Bucquet, 1897

O JARDIM DA SACERDOTISA

No teu corpo tu me pertences,
sete anos de brisa no cativeiro.
Foste da mesma matéria do ópio
que sorvi no cais à espera da barca.
Acerco-me de ti, música de loucos,
para queimar o pulmão nos astros.
O silêncio --- escuto-o de olhos fechados ---
conduz aos espinhos e ungüentos.
Na verdade, o pomar de abios
só existe nos sonhos do pássaro,
que aguça o tímpano e recorda
que no teu corpo a voz sem voz
habita no Jardim da Sacerdotisa,
que à noite venta, de manhã é luz.

Cindy Sherman, sem data

Não foi Deus quem me deu a notícia, mas um outro, a recomendação sábia de que a palavra é o mais elevado poder.

Não é de hoje nem de ontem, mas perdurando sempre e sempre surge aquela recomendação sábia, e ninguém jamais conseguiu ver de onde ela surgiu para brilhar.




Palavras de Antígona

Augusto Sander, sem data

O AÇOUGUE DE WERTHER

A primeira vez que entrei naquele estabelecimento – mais conhecido como Açougue de Werther – percebi mesmo algo diferente. Eu solicitei 1 quilo de carne e ele olhou furtivamente para uma edificação logo em frente: o Orfanato das Meninas de Santa Teresa de Ávila.

Na calada do sereno, entre um gole e outro de conhaque, Werther afia faca de matar porco.

Duas horas da madrugada, Werther salta o muro do orfanato.

As meninas dormem, dormem profundamente.

Sem palavras

Edward Weston, 2000

O sol, na manhã lavada, é a sombra do Deus. Ficamos ali vendo as mulheres mergulharem no oceano para esquecer, enquanto nos teus olhos li que a morte é a única sombra: manhã com céu a incendeia. Há no céu imensas curvas de cristal, e na cama os esqualos, faltasse água, morreriam à luz seca do meio-dia. Por isto fomos ao oceano com baldes de alumínio
caçar águas