ABRI-VOS, PORTAS DE OURO, ANTE MEUS AIS!
O que adorei até o osso, onde respira? Ido, dissoluto, se estende ar suave acima dos telhados da Casa de Água. No Oldsmobile verde-claro da ilusão passa Georgia O’Keeffe mariscando portas d’ouro entre duas ondas do mar. A çankha hindu afugenta demônios, excita os deuses benévolos. Toda devastação traz o germe de seu idílio. O coroado nó de fogo e o jasmim urdem o córrego nupcial. Quassar a raiz das cactáceas no areento. Na Casa de Água, à sombra de figueiras-bravas, a barca de Bach nascente.
quarta-feira, 27 de agosto de 2008
MEMÓRIA DO AGUAÇAL
Dedico à Paula Mota
Oculto na ramagem do que rascunho, respiro metade xamã, metade pesadelo. Rascunho quintal para garças e mar, enquanto o reino nublado, na vigília, se desfolha. O Buddha que não existe, quando escuta o aguaçal, recebe o pensamento do aguaçal. Depois vai arrancando de muros rentes ao palácio mil sóis ali avoantes. O que eu sei dos manuscritos do tímpano é que a matéria imaterial faz refém a matéria. No papiro de Stephanos – hermetista do século 7 – a palavra é uma lasca da voz do Buddha que não existe, inscrita em aguaçal que fia e tece: a fala é então sua luz e singra, íntima do vazio, à bordo da barca Nautikon.
Dedico à Paula Mota
Oculto na ramagem do que rascunho, respiro metade xamã, metade pesadelo. Rascunho quintal para garças e mar, enquanto o reino nublado, na vigília, se desfolha. O Buddha que não existe, quando escuta o aguaçal, recebe o pensamento do aguaçal. Depois vai arrancando de muros rentes ao palácio mil sóis ali avoantes. O que eu sei dos manuscritos do tímpano é que a matéria imaterial faz refém a matéria. No papiro de Stephanos – hermetista do século 7 – a palavra é uma lasca da voz do Buddha que não existe, inscrita em aguaçal que fia e tece: a fala é então sua luz e singra, íntima do vazio, à bordo da barca Nautikon.
A praia dos Insulados
No extremo sul da praia que apelidamos de a praia dos Insulados, imponente, ele, o leão de vento acorda e vem com a rapidez do raio até onde estou. Corro desesperado até à árvore mais próxima.
Subo na carnaúba, o leão de vento finca as garras de vento no tronco da árvore e, quando vai me destroçar com os dentes de vento afiados, eu acordo com o despertador marcando 7 horas em ponto.
Levanto, mergulho sob as águas do chuveiro, contemplo a íbis nevando no outro mundo enquanto faço a barba com Gillette G2; essas águas do chuveiro são contínuos choros dolorosos de uma deusa que teve o pescoço decepado.
No extremo sul da praia que apelidamos de a praia dos Insulados, imponente, ele, o leão de vento acorda e vem com a rapidez do raio até onde estou. Corro desesperado até à árvore mais próxima.
Subo na carnaúba, o leão de vento finca as garras de vento no tronco da árvore e, quando vai me destroçar com os dentes de vento afiados, eu acordo com o despertador marcando 7 horas em ponto.
Levanto, mergulho sob as águas do chuveiro, contemplo a íbis nevando no outro mundo enquanto faço a barba com Gillette G2; essas águas do chuveiro são contínuos choros dolorosos de uma deusa que teve o pescoço decepado.
A RESPIRAÇÃO DOS VELHOS
Esse poema foi escrito em reverência à vó Ana, 97 anos.
Cobrir-se com o plânctum da alegria, antes que o langor da preguiça nos olvide entre ceras. O nada da brisa, a perfeição da leveza nesse terreno coberto de bambus. Quantas noites mansas escuto grafadas em tábuas de caligrafia chinesa? Construídas com ossadas de velhos sábios, as tábuas guardam a respiração deles. A caligrafia salva do esquecimento: soluços, amor, relva, idioma de velhos sábios que reverenciam o silêncio nesse terreno coberto de bambus.
Esse poema foi escrito em reverência à vó Ana, 97 anos.
Cobrir-se com o plânctum da alegria, antes que o langor da preguiça nos olvide entre ceras. O nada da brisa, a perfeição da leveza nesse terreno coberto de bambus. Quantas noites mansas escuto grafadas em tábuas de caligrafia chinesa? Construídas com ossadas de velhos sábios, as tábuas guardam a respiração deles. A caligrafia salva do esquecimento: soluços, amor, relva, idioma de velhos sábios que reverenciam o silêncio nesse terreno coberto de bambus.
JARDIM SECRETO
Nesse deserto, o que é da turmalina
é da turmalina, sim, como pevides claras
circundadas de dureza natural,
a da pedra que é, turmalina que respira.
A turmalina – silicato complexo – mineral
exposto a crivos pluviais,
e a tantos outros crivos,
também de sombra e areia, de cascos
de camelos e sol alto, sol: concha ardente
que incide no tímpano da turmalina,
tímpano acordado nas dunas desse deserto,
escutando o quê? Talvez o jardim
que se abre sob o areal de Sahel,
e é jardim que não se vê com olhos,
nem com a imaginação,
se adivinha com palavras.
Nesse deserto, o que é da turmalina
é da turmalina, sim, como pevides claras
circundadas de dureza natural,
a da pedra que é, turmalina que respira.
A turmalina – silicato complexo – mineral
exposto a crivos pluviais,
e a tantos outros crivos,
também de sombra e areia, de cascos
de camelos e sol alto, sol: concha ardente
que incide no tímpano da turmalina,
tímpano acordado nas dunas desse deserto,
escutando o quê? Talvez o jardim
que se abre sob o areal de Sahel,
e é jardim que não se vê com olhos,
nem com a imaginação,
se adivinha com palavras.
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