quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009
Aqui, na Casa de Água, ao lado de Lucana que acabou de adormecer, descanso breves minutos, enquanto enrolo o meu cigarro com as folhas finas de um pequeno livro de mortalhas. Fiz muitos pôncios para amar Lucana, alguns pilatos, depois tive que lavar as mãos no chuveiro. Troquei Lucana por Barrabás, mas logo me arrependi e fui sorver, com ela, um chá verde numa xícara de linhagem. Composição para ouvido: eu preciso aprender a empurrar a chuva até a vidraça que a chuva quer molhar. Escuto a nostalgia que a chuva insiste em esquecer junto à porta. Mais molhada que o mar, a chuva desfaz o meu cigarro de folhas finas, desfaz meus cabelos, minha cabeça, a chuva só deixa intacto o gelo do coração que o sopro de Lucana abrasaria. Do tapete, antes de ir embora, recolho as garrafas de vinho e as pontas da erva-cidreira que fumamos desvairados, eu e Lucana, a tempestade lá fora, o perfume intenso do mar salgado lá fora, Órion e Sirius lá fora e, aqui dentro, acasos e cantigas no sereno oásis, eu e Lucana na Casa de Água escutando a última conta do rosário de neblinas.
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