quinta-feira, 6 de dezembro de 2007

A taciturna
(A partir de um texto de Paul Celan)


Quando vem a taciturna e quebra os canos, a casa fica sem água; a taciturna destroça rosais, canteiros de gérberas e a Casa do esquecimento exala um olor verde-mofo.

Para ele a taciturna verte a lágrima no escorpião; a taciturna sopra na pele; para ele ela enche os copos de sol; para ele ela murmura as sombras do amor.

Ele, da varanda da Casa do esquecimento, atira flechas em qualquer um: quem passa à frente da farmácia, flecha no ombro; quem sai da igreja dos Beneditinos, flecha na testa; quem entra no cartório, flecha nas costas; quem sai da lotérica, flecha no pé.

Ele arranca do peito o coração para a noite porque deseja a rosa.

A taciturna arranca a noite do coração porque deseja no peito a rosa.

Ele ela: olho no olho, no frio, presos nas profundezas, somem de si para sempre.

Ele:
– Escuto, o machado floresceu.

Ela:
– Escuto, o local não é nomeável.

Ele:
– Escuto, a chuva que a tudo observa cura o enforcado.

Ela:
– Escuto, falam da vida como único refúgio.

Ele ela transam debaixo das laranjeiras, onde o ar é puro e o céu alto e sem nuvens.

Nenhum comentário: