quinta-feira, 4 de setembro de 2008

AS JARRAS DE CIBELE CAMBUCI

Cibele Cambuci nunca fica de costas para as jarras cheias d’água na sala e, à mesa, talheres, prato, copo e o salmão grelhado. Ao canto da longa mesa, espiando o céu pela vidraça, Cibele Cambuci escuta o silêncio da sempre enevoada Villa Camboriú, atenta ao que nas coisas está sempre escutando!

Ainda lembro dela arrancar das jarras o vidro, contudo, sem vidro, não há jarras. Ela paira nessa sala de jantar e lê as Breves memórias de Alexandros Apollonios. As orações que Cibele Cambuci faz purificam as árvores lá fora. O amor é um menino em chamas no tombadilho, é a pata esmagada do cão por um trem, sobretudo, o amor conduz à elegância e faz com que toda seriedade fúnebre suma na curva da açucena ou toque um noturno na flauta de sua própria coluna vertebral.

Nessa manhã antiga, à sombra de árvores seculares, e também à sombra das jeunes filles proustianas, eu, definitivamente, decidi que não posso andar por aí com as jarras cheias d’água de Cibele Cambuci, mas posso consentir que alguém queira escutar o silêncio que Cibele Cambuci escuta.

Se aqui eu estivesse com as jarras, uma em cada ombro, o máximo cuidado teria para que não caíssem, as jarras, nas pedras. Sejamos reverentes à verdade sóbria e pura: nenhum de nós nunca chegou a existir para que houvesse alguma possibilidade de paraíso após o último suspiro.

Tão absolutas as jarras cheias d’água de Cibele Cambuci. E tão maciçamente seca e pétrea a caveira. Tão jarras d’água as jarras de Cibele Cambuci. Só com elas Cibele Cambuci pode ver a estrela.

Imersa no vento, onde respira, Cibele Cambuci aprende que a vida é vã como a sombra que passa, e que as jarras são jarras, mais que sombras, porque jarras fazem sombra e nunca sombras fazem jarras.

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