O FINAL
DE UM CORO
DE EURÍPEDES
Eu confesso que, às vezes, também penso que sou uma divindade que delira nos corredores da Biblioteca de Alexandria. Na verdade não sou divindade, talvez um monge copista. Chegou ontem, ao diretor da biblioteca, um pergaminho sujo com os dizeres escritos a carvão: “O livro perdido de Tácito”. Eu o copiei cinco vezes; é um breve opúsculo. Cinco horas da tarde – aqui estou – e a Biblioteca de Alexandria ainda não foi incendiada pelo califa Omar.
Eu durmo num dos cômodos da biblioteca. Cada copista tem direito a um quarto rústico: copo d’água, livro de orações, rosário.
Quem não se cuide acaba enfermo pulmonar, tanto é o frio que silva nas galerias, entre as prateleiras repletas com 800 mil obras raras. Indizível a melancolia que paira nesse lugar e vou andando – há lugares onde nunca entrei –, vou andando com o candeeiro na mão, avisto à esquerda a porta que dá para o vestíbulo ensombrado. Dentro dele duas estantes com livros empoeirados; os títulos são interessantes, alguns canhestros, outros grossos e há os finos e, sobre uma cadeira, avisto aquele que dizem ser o mais belo livro do mundo, e se intitula: O final de um coro de Eurípedes.
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