Violino ao som da saliva
o sabor do ácido me desce à garganta
e o dia percorre a água na ferrugem
nos lábios férreos que beijam a estrada
vocifera um som metálico
e sua a última tinta do meu rosto
carvão-grafite na paisagem de uma janela
hoje
mais uma vez o corpo some, sim,
líquido perdido
o perfume situa o sem-sentido
vago, vazio ou mesmo fúnebre
e com o círio tento tatear-me
no clarão que insiste na brancura
e ao
torcer o azul até que a retina
tatue uma valsa
a boca saliva outro ritmo
e o olhar natimorto dança nas cordas
spalla
que orquestra uma tela, pedra ou sol,
onde aos poucos um som abre
o breu
pulmão fígado pâncreas coração
rígidos em câimbra
um vermelho-pálido se mistura a bracurazul
não mais rosto, não mais sangue
umas vozes que se perdem ao sinistro som
ao mundo
som e saliva, violino, voz
meu não-rosto não mais me assusta
se ainda me debato sobre o que se perde
pura resistência
porque já comi o próprio timbre
mordi a língua
amputei pernas e braços
cedi órgãos para uma tela
abandonei o sangue noutro corpo
e
a música que se impõe
desce à garganta engolindo cores e cordas
da voz a última lembrança:
anos carregando corpo ao som férreo de fantasmas
Marco Vasques
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