O vendaval e seu assombro afundam nas vidraças, nos azulejos e nas pedras ardentes. Nem sabe o vendaval que é invisível. Nem o invisível sabe que é vendaval. Quando nada acontece, temos duas escolhas: escutar o sortilégio que jorra dos olhos de Oxum ou irmos ao bordel cuspir aguardente na coxa das três mulheres do sabonete Araxá. O sopro de K. enfia-se no vendaval e os dois erguem a saia das mulheres, arrancam da cabeça dos pescadores os chapéus de palha, escandalizam as roupas no varal e eles invadem, também, portas e janelas das casas e, contam os pescadores, o sopro de K. dentro do vendaval pode ser visto – agora – circulando daqui para ali seu transparente movimento. No único antiquário de Villa da Concha, K. adquiriu o martelo essencial e, com ele, vai esfacelar a fria lesma, a fria sombra do agouro, a fria palavra de gelo. Sob o céu o vento faz uma imensa curva de cristal. Na livraria próximo ao antiquário, K. encontra o primeiro fólio do nebuloso incunábulo Imago Mundi, do filósofo Hervum. Tanto vendaval suspenso na altura do ar refrigera e dissolve os maciços do sol, resgata da cinza da infância o fluido fio marinho, a castidade da serpente, o fogo e os fogos. K. rabisca um fino corte de faca na curva de cristal e o cristal apenas tem forças para dizer, com Quevedo, que o que desejamos é:
No ondas ni luciente cristal:
agua al fin dulcemente dura
No ondas ni luciente cristal:
agua al fin dulcemente dura
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